16 de novembro de 2014

Inéditos de Suiá Omim



[Imagem de Berna Reale]


MADEIRA

nem cozido, nem cru
só podre

cozinha do tempo
resina de despejo
tentativa de construção
elaboração
e transformação
uma cura na leitura
uma inflexão na escrita
indefinível

nem melodia, nem harmonia
só palavra mouca

as pedras que estão abaixo dos pés
ficam pesadas
em contato com o lago(i)mundo
e a canoa-corpo faz tremer
por vezes
o meu velho interior

faz imaginar que a letra
de uma palavra
de algum livro
possa sentir cócegas
um dia
ao ser
manuseada
palmilhar


FIRST OMM

catou o botão que se soltou da blusa
trocou o laço pelo nó
entrou villas por horas seguidas

caiu na política
na magia
sem arte avessa ao casaco
luxúria é pouco
o sexo se estende
muito além da última nota
tocada ao piano
bolls.com
bell
jar
emitidos
passos e pereira
manuel contou um pouco
ao pé do ouvido
mas deixou-o curioso
esperando palavras
combinadas na voz que roça
“a teus pés”
a.c. são ótimas iniciais
derramou chá e quis
parar com toda seqüência
ninguém atende
disse o atendente
a idoneidade de uma empresa
não está estampada
nos dentes brancos conseguidos
pelo photoshop do outdoor
comeu hotdogs e xingou seu mundo
caráter não se esvai
na primeira camada de sal
mas petróleo

o botão balançava no bolso
do casaco do homem
que andava como quem ama
a escuta deixou-o aturdido
o volume máximo era o silêncio
nos caminhos de neve
entre as finas árvores
perdeu-se o botão
que há pouco
estava tão próximo ao coração
descompassado
soltou-se
no deserto de neve
aquele minúsculo botão existe


ESCONDERIJO

fazer um sirshasana nua
diante de platéias de todos os cantos
uma passarela
meu sonho do trem fantasma
meu te-ato oficina
eu estive lá
fez-me rir e temer
andar
no estremecimento do suporte pouco sólido
nudez pública
meninos gays que temiam o circo
escolher o horror
sim
os filme de terror
gosto até hoje
afinal
assisti o anticristo
até o final
(sem fechar os olhos ou quase)
e voltei andando para casa
aterrorizada
eletrizadoida
como a personagem-outro
bruxas
devires
animais

capturou-me de tal modo
a cápsula oswald
o rey

chorar
foi escrever para começar
sem saber se quem apareceu
foi tristeza
beleza
ou simplesmente
exaustão
da condição de tesista
e semi-mãe
semi-mulher
semi-dormindo
semi-acordada
tanto quanto durmo
tal qual acordo
viva no mundo do texto
à deriva do resto do mundo
a vida é passageira
gozo não foi
será sempre
a ser


VÓRTICE OU COSMOHÉLIO
(com André Demarchi)

o alcance da espessura
rasteja
contraventa-se

cosmopedra
diluída em sal
de vida
vórtice
amargo
e
torto
deslumbra-se

hélio e seus rastejos
hão de voltar
prensados
e verdes
in fritura
cosmokaya


GERÚNDIO

que amor
(movimento)
será este
do instante
pós poema
pós nova implosão?
respiro o texto sorrindo
e cercando de mais amor
o meu dia
(dias solitários)
apenas com ela
a incontornável
demolidora mor
até por que se faz de
amor e suor


Suiá Omim nasceu no Rio de Janeiro (RJ). É poeta, antropóloga e professora da Universidade Federal do Tocantins. Atualmente, prepara a edição de seu primeiro livro de poemas.