15 de abril de 2015

Política/Poesia//Manifesto - Primeira parte

    Imagem: Foto do Autor nos anos 80

Por Marcelo Ariel

1.1 A poesia como emanação do sagrado chamado Natureza, não se configura como uma potência da ilusão dicotômica chamada ‘mercadoria’. O  ouro e o petróleo, moeda cunhada por Tânato e não por Eros, não pode ser comparado com O Sol do Poema Contínuo, cujos raios atravessam o Real que em breve provocará a devastação de todas as ilusões, a começar pela ‘ilusão da mercadoria’
Comentário: Não apenas do sagrado mas do impessoal ainda não catalogado por nenhuma religião, emanação da não-palavra e algo que pode acontecer em instâncias fora ou longe da literatura.
1.2 Quando absolutamente desvalorizada e fantasmagorizada, talvez a mercadoria possa até se tornar um poema ou parte de um poema, quando se dá a fantasmagorização do que fantasmagorizava; ou seja, da mercadoria, ela pode até se tornar parte da emanação do poema. Oswald, cuja maior contribuição para o tremor do conhecimento do antidevir-Brasil foi a frase “Tupi or not tupi, that’s is the question”, se vivo estivesse iria defender o plantio da mandioca em praças públicas e a desmercantilização da comida: frutas,arroz, feijão e tapioca de graça para todos. Seria bom se entre um bairro e outro existissem não estas patéticas torres de escritórios, mas pomares públicos e imensos bosques, o que me lembra ‘ A Cidade do Homem Nú” de Flávio de Carvalho, o antiNiemeyer
Comentário : Existem forças opaciantes do mundo do consumo que  deixariam o poema ser vendido na Bolsa de Valores, isso iria exigir uma mutação do capitalismo ou um  esvaziamento e banalização do poema, mas falo de outra coisa e não da idéia que gerou o Banco Van Gogh, é bem mais sutil o que estou querendo dizer.

1.3 a poesia é tão temida quanto o “Real” que ela anuncia, pela sociedade de consumo cada vez mais autofágica.O Irreal governa a Bolsa de Valores e é o vetor de muitos editais do governo
Comentário: Existem vários estatutos do real, tantos quanto universos, mas uma inequívoca força de irrealidade que serve de vetor para as simbologias neutras e abstrações perversas do dinheiro, que um dia alcançará uma dimensão poética para seu uso, ouro usado como asfalto e etç.
1.4 Para mim, infelizmente, o que existe com mais frequência hoje se parece mais com um culto da imitação da poesia. A poesia é, por natureza, uma força do obscuro, quando alguém diz “Lixo da metafísica”,  talvez esteja se referindo a um fracasso da historiografia filosófica de encarar a poesia como algo menor . Heidegger foi um dos poucos que colocaram a questão do “habitar poéticamente o mundo”, questão que ainda está em aberto. O mundo da mercadoria não pode ser chamado de mundo, logo ele é também ignorado quando habitamos poeticamente este ‘Topos’, ‘ Atopos’ ou ‘ Utopos’ ao mesmo tempo, chamar esses ‘topos’, ‘atopos’ e ‘ Utopos’ de ‘Vida’ é um modo de encarar esta questão colocada por Heidegger? Talvez…
1.5 A Poesia é como o PCC. Precisamos de um PCC Cultural, costumo dizer isso: a situação de um poeta-escritor que está fora das panelinhas filiais ,nepotistas ou do álibi institucional é similar a de um presidiário em uma cela lotada, mas tudo é reconfigurado pelo mercado dos álibis , principalmente o que advém das ações terroristas do próprio mercado que se confunde, se mistura com o Estado – tudo é reconfigurado ,  menos a grande poesia que se desloca em outros tempos e funda imaginários de alteridade.
1.6 Kierkegaard, um dos mestres de Fernando Pessoa, associava o horror a um estado de abertura e não de fechamento. Os olhos se dilatam quando estamos aterrorizados, mas só os olhos de fora? Por que não fundar um horror-terror para os olhos de dentro, que não apenas se dilatam, mas explodem como o Sol. A questão, para mim, não é sair do horror, mas atravessá-lo e chegar a regiões, altas ilhas do ‘real’, que ele não pode alcançar. O horror econômico, por exemplo, não pode alcançar uma cadeira na calçada de uma rua em uma cidadezinha invisível no Brasil profundo, pode? Ele, o Horror, pode alcançar uma interioridade configurada pela poética do encontro? Pela grande poesia da humanidade? Quem está se suicidando é capital, os poetas, os bons poetas que descobrem Eros e o riso de Cérbero e de Menipo, o horror não pode tocar neles… Veja o caso da permanência de “Terra em Transe”, de Gláuber: daqui há cem anos, esse filme ainda estará alimentando as interioridades contra o Horror.
1.7 O primeiro poema que escrevi na vida se chama ‘Acordar’ e não consegui concluí-lo até agora e o último se chama ‘ Scherzo rajada’ – este estou escrevendo nesse momento. A poesia não vem do poeta, vem do Daimon. Quanto mais perto de Sócrates, ficarmos melhor, mas o ato de assinarmos um texto é anti-socrático: ainda estamos longe da Alma.

1.8 Restam os mitos, Os mitos. D.H. Lawrence dizendo para Freud deixar ‘Édipo’ em paz, pode ser uma proposição interessante. Diante da impossibilidade da existência do nada, o mito é tudo. Mas como Lawrence também constato que precisamos lutar contra a banalização ou o uso funcional e mercadológico do mito. A poesia oral e todas as imensas possibilidades do ‘ ‘Spoken Word’ e do R.A.P. apontam para uma pequena renascença do poema: se não é lido pelas massas, poderá ser ouvido?
Nota de inadequação: Onde se lê poesia, leia-se  ' poema ' e não poeta.